Esta charge do Spon
holz e o artigo estão no Blog do Aloizio Amorim.
Com uma frase
enganosa, e certamente errada, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva
externou solidariedade aos criminosos de seu grupo íntimo que foram condenados
no processo do mensalão e levados para o merecido lugar: a cadeia. Vários
jornais publicam na primeira página que Lula ligou para esses aliados, no
momento em que eram conduzidos ao cárcere, e afirmou: "Estamos
juntos". A frase é mentirosa e está errada porque, se fosse prevalecer a
verdade, certamente seria: "Deveríamos estar juntos".
Quando teve início
a Ação Penal 470, e dinheiro público era desviado debaixo do nariz do
ex-presidente para comprar apoio político no Congresso Nacional e também para
outras finalidades ainda piores, ele procurou difundir a versão de que não
sabia de nada, não viu nada. Esses desvios de milhões, conforme ficou claro no
processo do mensalão, eram praticados por pessoas de seu círculo íntimo, que
entravam e saíam de seu gabinete a toda hora, sem ao menos ter de pedir
licença. Eram o seu chefe da Casa Civil, José Dirceu, o presidente do PT, José
Genoino, o tesoureiro do partido, Delúbio Soares, e outros.
Como o grupo tinha
gabinete ao lado de Lula, naquele lugar preservado e íntimo, só uma pessoa
acreditou que o ex-presidente não sabia de nada, não viu nada: o então
procurador-geral da República. Apesar das evidências e do que diz a legislação
penal, ele praticamente absolveu Lula (ato que é privativo do Judiciário) e o
deixou de fora do processo.
Seria perfeitamente
razoável incluí-lo na denúncia, pelas evidências de sua participação, e deixar
que o Judiciário tomasse a decisão cabível. O Código Penal brasileiro é claro
ao afirmar que existe crime tanto por ação como por omissão, tornando certo,
quanto à omissão, que "é penalmente relevante quando o omisso devia e
podia agir para evitar o resultado" (artigo 13, parágrafo II).
A Constituição
federal, por sua vez, no artigo 102, I, b), confere ao Supremo Tribunal Federal
a necessária competência para julgar o presidente da República nas infrações
penais comuns. A Corte ficou privada do dever de aferir a responsabilidade do
ex-presidente - e isso milhões de brasileiros lamentam.
Como era de Lula a
obrigação de cuidado, proteção e vigilância das leis e da Constituição, pois
jurou cumpri-las, ficou evidente que, ao se omitir, criou o risco e concorreu
para o resultado. Sua responsabilidade, diria Nelson Rodrigues, é
"ululante", porque não dá para imaginar que toda a roubalheira
ocorria ao seu lado sem ele nada saber.
Mas a ação penal
acabou proposta sem incluí-lo, mostrando que nessa conduta houve uma acomodação
que não é típica do Ministério Público (MP). A exclusão de Lula deveria ser ato
privativo do Judiciário, e não do MP.
Curiosamente, dias
atrás, quando o Supremo debatia o início de execução das penas no processo do
mensalão, outra atitude do MP, bastante estranha, chamou a atenção e sugeriu a
ocorrência de ação entre aliados destinada a impedir a realização do
julgamento. O País fora informado pelos jornais, rádios e televisões de que
seria realizada no dia 13 de novembro a sessão de fixação e cumprimento das
penas. Mas, embora isso já estivesse público, no início da noite anterior,
quando se encerrava o expediente, o atual procurador-geral deu entrada a uma
petição em que requeria exatamente o que a Corte se reuniria para dispor: a
execução das penas.
Ora, com a sessão
já estava marcada para essa finalidade, tal requerimento se tornava
absolutamente dispensável e desnecessário. Pareceu, portanto, um ato errado,
mas inocente. Depois se verificou que não era bem assim, porque a petição tinha
endereço certo: a pretexto de exigir a execução das penas, ela se prestava a
adiar o julgamento por mais alguns meses.
Não fosse a firmeza
do presidente do Supremo e relator do processo, Joaquim Barbosa, teria sido
aberto prazo para que os advogados pudessem contraditá-la, adiando o
julgamento. Somente um dos ministros pareceu ter conhecimento prévio de sua
existência, Ricardo Lewandowski. E vem daí a desconfiança, porque, em suas
manifestações no caso do mensalão, ele sempre pendeu em favor de José Dirceu,
José Genoino e Delúbio Soares.
Aberta a sessão,
esse ministro, com todo o seu fôlego, passou a martelar nos ouvidos de todos
que se impunha abrir prazo para que os advogados tomassem ciência da petição,
caso contrário restaria nos autos uma nulidade, por infração aos princípios do
contraditório e do devido processo legal. Ao seu estilo, bastante inflamado,
mostrou-se indignado por não ser aberta vista aos advogados, para que se
manifestassem sobre o pedido do MP.
Foi ajudado nessa
defesa pelo ministro Marco Aurélio Mello, que demonstrava estar muito irritado
com o presidente Joaquim Barbosa. Naquele momento, aceitar os argumentos de
Lewandowski e Marco Aurélio significaria fazer o que os condenados mais
desejavam: empurrar com a barriga o julgamento por mais alguns meses. As duas
ministras, com alguma ironia, estranharam a discussão e ponderaram que apenas
tiveram conhecimento da petição do MP pelos jornais.
Nesse clima, em que
crescia a ideia de uma ação entre aliados, o ministro Gilmar Mendes bateu
pesado, com críticas às demoras anteriormente ocorridas, por força de manobras.
Mas foi o relator e presidente, ministro Joaquim Barbosa, quem mais fez força
para superar a irritação decorrente da manobra - chegando a perder o
equilíbrio, em determinado momento, usando expressões inadequadas.
No fim, a
contribuição do Ministério Público e a defesa inflamada de Lewandowski
mostraram-se inúteis, porque a petição acabou ignorada e o início da execução
das penas restou aprovado. Sobrou a lição.