A Copa como ela é
EDITORIAL
FOLHA DE SP - 09/04
Cansada de falsas promessas
e desperdício de recursos públicos, população já não considera que Mundial foi
um bom negócio para o país.
Diante do evidente
descumprimento de prazos nas obras da Copa do Mundo no Brasil, não convinha ao
principal executivo do Comitê Organizador Local fingir que tudo ia bem. Em
março, após reunião na Suíça, onde fica a sede da Fifa, Ricardo Trade afirmou:
"Somos bons em entregar no final".
Não chegava a ser um elogio;
talvez uma resposta a Joseph Blatter, presidente da entidade máxima do futebol.
No início do ano, ele declarou: "O Brasil ficou ciente do que é a Copa do
Mundo agora. (...) É o país mais atrasado desde que estou na Fifa". Ou
seja, desde 1975.
O dirigente comentava o fato
de que seis dos 12 estádios do Mundial não tinham sido inaugurados até a data
estabelecida, 31 de dezembro de 2013. Também poderia ter em mente as prometidas
obras de mobilidade urbana, que, além de fora do prazo, terão apenas metade da
dimensão planejada.
Motivos para criticar a
organização do torneio não faltam, e não só a Fifa os tem de sobra. Como
constatou pesquisa realizada pelo Datafolha, a maioria dos brasileiros passou a
considerar a Copa como um mau negócio para o país.
De acordo com o instituto,
55% dos entrevistados entendem que o Mundial trará aos brasileiros mais
prejuízos do que benefícios, enquanto 36% esperam um saldo positivo. Em junho
de 2013, em levantamento conduzido no período das manifestações, os otimistas
(48%) superavam os pessimistas (44%).
Além dessa inversão, há
outro dado que deve tirar o sono dos envolvidos com a Copa, de governos a
cartolas: pela primeira vez, menos de metade da população se declarou a favor
do torneio. Se, em novembro de 2008, 79% diziam apoiar a realização da Copa e apenas
10% eram contra, estes agora são 41%, e os favoráveis, 48%.
Os protestos do ano passado
parecem ter sido o catalisador do descontentamento crescente, mas sua origem
está na própria incúria da organização. Aeroportos são entregues incompletos,
surgem suspeitas de superfaturamento em estádios, obras elétricas atrasam,
operários morrem nas construções; a lista de notícias negativas é longa.
Ao mesmo tempo, não se
percebe, nas cidades, as melhorias alardeadas nos últimos anos. Nota-se apenas
que a organização do Mundial não para de drenar recursos públicos --negando por
completo a ideia de que a Copa seria realizada com dinheiro privado. Em 2010,
estimava-se que os estádios custariam R$ 4,8 bilhões, mas seu valor passará de
R$ 8 bilhões.
A população enfim dá mostras
de não mais tolerar falsas promessas e tanto desperdício. Vale voltar a Joseph
Blatter, segundo quem só agora o Brasil se deu conta do que é a Copa do Mundo.
De fato.
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